abril 11, 2011

Carta de Despedida VII

vou dar continuação à história a pedido da Maria (http://cmariaaa.blogspot.com)
Gonçalo recebera uma carta, passados três meses, não tendo antes noticias de Martim.
«Desculpa não te ter dito nada mais cedo, eu sei que tinha dito que o fazia. Mas tive de fazer uma data de treinos e coisas assim, não tive tempo. Isto é um pouco excessivo na minha opinião, custou-me imenso adaptar-me no inicio. Temos de nos deitar entre as onze e a meia-noite e ás quatro e meia somos acordados, tempo 10 minutos para fazer a cama e mudar de roupa, tomar banho só de noite, porque senão não temos tempo, depois temos de nos dirigir ao refeitório, tomamos o pequeno-almoço e depois dirigimos-nos para o campo de treinos. Lembraste quando víamos na televisão aqueles filme e depois dizias "aquilo não deve ser assim tão difícil?" Pois não, é pior, parecendo que não, só fazer aquilo já custa, fora o resto. Mas também não me apetece meter-me com pormenores .. Vou mudar de quartel de novo, já é a terceira vez, vou ficar ainda mais ausente do que já estive, não sei quando poderei voltar a dizer-te algo, nem sei se poderás responder-me porque, provavelmente, quando receberes a carta já não estarei mais neste quartel. Sabes outra coisa? Mais uma vez, tinhas razão. De nada me valeu aquela decisão precipitada. Estou aqui e, mesmo assim, não tenho vontade de nada, só penso nela e a cada dia que passa maior é a vontade de me ir embora, de ir ter com ela .. O pior de tudo é que ainda tenho de cumprir mais um ano e nove meses. Mais uma vez tinhas razão e mais uma vez quero-te pedir desculpa por isso. Tenho também de te pedir um favor. Gostaria que fosses a campa dela, deixar lá umas flores. Eu antes ia lá todos os dias, até mais que uma vez, sabes .. reconfortava-me pensar que ela poderia estar ali e sentir que eu estava lá, que me preocupava, que estava arrependido, eu dizia sempre o mesmo: o quanto a amava, o quanto queria mudar as coisas... Gostava de ter sido eu a ir, não ela; sei lá, eu que tivesse morrido num acidente, não ela que se tivesse matado, ela tinha muito mais que eu para dar. E deu tanto por tanta gente e foi, esquecida assim .. por todos e tão rapidamente. Tenho de me despachar, por isso, assim que conseguir mando-te uma mensagem com a morada do quartel, eu arranjo um telemóvel. Cuida-te irmão.»
Passado um dia recebeu uma mensagem de um número desconhecido a indicar uma morada, o qual dizia para não responder para lá. Gonçalo, sentou-se na secretária, a olhar a folha um pouco esborratada, manchada por uma ou duas lágrimas que Martim lhe tinha enviado. Agarrou numa folha branca e numa caneta e começou a escrever a resposta à carta recebida no dia anterior:
«Eu não queria começar a carta a dizer-te isto, mas tenho de o dizer e se digo, digo logo de inicio, eu já sabia que irias, mais tarde ou mais cedo arrepender-te dessa decisão, mas agora já não há nada a fazer e eu, para ser sincero, desta vez, não tenho muito a dizer já; a Matilde fez a sua escolha e tu fizeste a tua, embora ambas tenham sido erradas. Eu já te conheço e sei que, mesmo gostando dela, és demasiado orgulhoso e, se ela ainda cá estivesse, não irias dar o braço a torcer, eu sei-o e tu também o sabes. Iam sofrer os dois de qualquer forma, era inevitável. Ontem, enquanto arrumava algumas coisas em tua casa - já sabes que ela me fazia confusão, sempre tão desarrumada - encontrei uma carta que ela te tinha deixado uma vez, datava de há  4 meses e tu nunca a tinhas aberto; peço-te desculpa mas abri-a e sabes o que dizia? "Eu amo-te mais que tudo Martim, não sei porque é que ambos somos tão orgulhosos e não nos conseguimos entender, nós já não vivemos um com o outro, vivemos um para o outro, não conseguimos estar sem estar juntos, sabes disso. Eu deixo o orgulho de parte, por nós, se tu também deixares! Amanhã irei ter ao sítio do costume, aparece se ainda me amares! Beijo, Matilde". Tu nunca a leste e, conhecendo-a como conhecia, calculo que ela tenha achado que já não a amavas e, dias depois, deu-se o que se deu. No dia em que encontrei a carta eu estava com Maria e ela disse-me "nesse dia ela ligou-me e disse que tinha sido o fim. Disse que iria acabar com tudo de vez" começou a chorar e depois disse "ela disse-me o que ia fazer e eu, não percebi, por isso não a detive". Fomos todos uns cegos, ela amava-te como ninguém. Não te estou a dizer isto para te sentires pior, mas acho que tinha o dever de te contar. Temos ido, os dois, eu e Maria, todas as semanas, sempre que pudemos, ao cemitério e, tal como fazias, deixamos sempre lá um lírio branco, não temos sido os únicos a lá ir; temos lá visto os pais dela, alguns colegas da escola. Ao contrário do que disseste nem toda a gente se esqueceu dela. Têm também me perguntado por ti e eu digo sempre que estás bem, mas que não sei bem em que parte do país te encontras pois encontras-te sempre a mudar de sítio, como é óbvio eu não sabia como estavas mas não queria transmitir as minhas preocupações aos teus amigos ... Apesar de te teres ido embora sem me dizeres nada não te julgo, eu sei que iria ser difícil para ti a despedida depois de tudo, iria parecer muito definitivo não era? Ainda para mais depois do que aconteceu .. Pois bem, apenas te peço para voltares meu irmão. Cuida de ti! Gonçalo.»

[inventado]

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